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Os cachos tão rejeitados de Betina

Atualizado: 3 de dez.


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Betina é uma menina de 8 anos que mora no interior de Minas. Ela vem de uma família onde a parte materna é de descendência europeia (alemã e italiana) e a paterna, portuguesa e africana. Mesmo com esse mix de ancestralidades, há uma coisa que Betina nunca foi ensinada, a amar seus cabelos cacheados.


Betina cresceu vendo sua mãe tendo dificuldades em cuidar dos cachos da filha, já que ela mesma tinha o cabelo lisinho, como a típica linhagem. Do lado do pai, achou que pudesse encontrar apoio, mas estava enganada, as mulheres de lá não usavam seus cachos, pelo contrário, o alisavam por toda vida.


Betina nunca viu os cachos naturais de seus familiares e ainda criança, não entendia o porquê dessa negação, então aos poucos foi acreditando que era assim: quem nasce de cabelo liso é bonita, desejada, capa de revista. Quem nasce cacheada, nunca ocupará esses espaços na sociedade.


E se viu ali, sozinha. Ela. Os cachos.


Até que no começo de sua adolescência foi vencida pela pressão silenciosa de padrão de beleza e resolveu entrar na tal moda de alisar os cabelos. Ela acreditava que essa seria a única solução para seu problema, o de ser aceita.


E foi alisando, escovando, pranchando. Até parecer que nasceu assim.


Fez isso dos 14 aos 29 anos. Sem tirar nem por. Sem pausa.


Betina então, já uma mulher adulta, tinha aprendido nesse longo caminho, muito sobre auto amor, auto aceitação, pertencimento, autoestima. E um belo dia decidiu deixar os cabelos voltarem à sua essência, aos até então rejeitados cachos. Durante o período de transição, ela pegava as fotos de menina que por um bom tempo evitou olhar e finalmente as encarava. Só que para a surpresa de Betina, aquele medo de ver uma descabelada na foto se foi e trouxe algo muito melhor: ela se achou linda naquelas fotos!


Foi aí que Betina entendeu que não importava se a família de cabelo liso não sabia ajudá-la com seus cabelos, ou se a família de cabelo cacheado ainda não aceitava o próprio cabelo. Ela mais que tudo queria seus cachos de volta e pela primeira vez, começou a amá-los!


Nesse clima de nostalgia, lembrou das vezes que a prima cacheada era proibida pela mãe de entrar na piscina para não molhar os cabelos escovados. Lembrou também das vezes que familiares comentaram que seu cabelo era desalinhado e passavam a mão nele com movimentos firmes e contínuos, de cima pra baixo, tentando diminuir aquele volume tão característico e que é o que ela mais ama.


Mas nada disso lhe trouxe tristeza. Hoje não mais. Agora é só alívio. Alívio de se aceitar, de se amar, de encontrar em seus cachos uma forma de expressão pessoal que ela ama e também de celebrar sua ancestralidade.


Consciente de que ainda existem muitas mulheres que lutam contra a própria natureza, ela hoje já não o faz mais. E tudo bem, calma, no seu tempo. Betina teve o seu, elas terão o delas, ou não. E se acontecer, sejam elas lisas, cacheadas, crespas ou alisadas e qualquer outra variação, que elas possam se sentir e, de fato, ser si mesmas, independente do cabelão.


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1 comentário

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23 de mai. de 2023
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Orgulho das palavras dessa escritora talentosa e da Betina, que teve coragem de enfrentar, por vezes, alguns preconceitos e aprender a se amar e valorizar, independente do julgo de outros. Eu me senti como a Betina por vezes e também pranchei, alisei e escovei. Meus cabelos não eram iguais aos da Betina, mas já passei pela fase de não aceitação. Não é fácil, mas quando aceitamos, ninguém mais nos segura! Conheci a Betina criança com seus cachos, a Betina adolescente com seus lisos e agora a Betina atual. Todas são e foram lindas, e, além disso, de coração bom, caráter impecável e guerreiras! À Betina de agora, a versão que ELA mais gosta, é a mais linda! Com amor: Ju (amiga de infância,…


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